Envelhecer é uma arte e requer grande capacidade de adaptação emocional e física. Não sentimos quando estamos envelhecendo, aliás, por dentro nos sentimos sempre a mesma pessoa, e isso às vezes nos assusta. Envelhecer é amadurecer! Enquanto nosso exterior se enruga, perde o viço, a flexibilidade e o tônus, nosso interior se aperfeiçoa ano após ano. Ganhamos sabedoria, paciência e novas atitudes e valores perante a vida. Nessa condição privilegiada, qualquer idoso deveria estar na melhor fase de sua vida. Mas não é essa a realidade.
Cuidei dos meus avôs por quase cinco anos, de 2002 a 2006, e ao contrário do que muitos pensam ou dizem acerca do cuidador, foi um privilégio ofertado por Deus.
Nada é tão enriquecedor do que conviver com um idoso! Nem os livros dos melhores especialistas contêm a riqueza, os detalhes e as peculiaridades dos idosos proporcionados pela convivência diária. Só no dia-a-dia você passa a compreender o quão deficiente é o mundo para os idosos. Sim, o mundo é deficiente, pois ser idoso faz parte do “desenvolvimento normal” do ser humano. Foram anos de graduação e pós graduação na prática, na realidade enfrentada.
Vou relatar esse pedacinho da vida da minha avó frente a esse mundo DEFICIENTE.
Certa tarde cheguei em casa e encontrei minha avó de cara amarrada, pois não havia assistido a tão amada novelinha da tarde. Indaguei o motivo e ela me respondeu que queria trocar a televisão, pois esta não estava funcionando direito. Corri para a sala de TV e constatei que não havia som. Mudei os canais e todos estavam sem som. Desliguei e liguei a TV e o som voltou. Inventei um problema qualquer e pedi para ela observar se ia acontecer de novo, daí eu chamaria o técnico.
Bem, esse problema não mais aconteceu nos próximos dias, até que outro problema apareceu. Minha avó reclamou que a TV estava chiando muito, “não entendo nada do que falam, parece até outra língua”! E insistia para comprar outra TV. Fui averiguar, e dessa vez descobri que ela havia apertado sem querer a tecla SAP. O filme que passava na hora estava com som original em inglês. Tive um insight e deduzi que ela poderia ter apertado a tecla MUTE da outra vez.
E daí por diante comecei a observá-la usando o controle da TV. Constatei primeiramente que para mudar os canais, de nada lhe serviam as teclas numéricas. Elas são muito sensíveis e minúsculas. Sempre aconteciam duas situações: ou seu dedo pressionava duas teclas ao mesmo tempo, tornando o canal 5, por exemplo, em 56 ou apertava com mais força, e o canal 5 virava 55 ou 555. Tentei isolar essas teclas e outras que ela não usava com uma “fita crepe” e ensinei-a a usar as teclas + e – para mudar o canal, pelo menos elas eram maiores.
Mas “problemas novos” na TV continuaram a aparecer: tecla SLEEP, tecla TV/VÍDEO, tecla MENU e a insatisfação da minha avó em relação a TV.
Tive a idéia então de pintar as teclas com esmalte. Vermelha para ligar/desliga, branca para mudança de canais e azul para o som. Parece que eu havia conseguido resolver o problema, até que um dia, ao recebermos visitas em casa, vi minha avó escondendo o controle remoto. Fiquei sem entender, mas pensei que talvez ela não quisesse que as visitas assistissem TV. Depois que foram embora, perguntei à ela sobre o controle e ela me encarou firmemente e respondeu: “Olha que controle feio, eles vão pensar que eu sou criança!” Não tive argumentos, o controle estava horrível, enrolado com “fita crepe” e com as teclas pintadas, parecia que estava todo remendado e descuidado. Não tive dúvidas, troquei a TV. Passei dias andando e averiguando os controles. Comprei a TV com o controle mais simples. Bela maneira de se escolher uma TV! Não consegui um controle ideal, e comprei uma tv mais antiga, mas pelo menos um pouco mais funcional para um idoso.
Achei também um controle remoto gigante, mas para minha vó que queria discrição, não era o ideal.
No fundo, tenho certeza que ela sabia que a outra TV não tinha problemas, mas assumir isso, era declarar-se DEFICIENTE E INCAPAZ. Acredito que se existissem controles mais simples para TV e outros acessórios eletrônicos esse sentimento nunca teria rondado em sua tão longa vida. Ela não era INCAPAZ, era simplesmente uma idosa.
Temos brinquedos, móveis, acessórios e comida para crianças e animais. Porque não para os idosos? Como as crianças, idosos não têm força de preensão nem muscular. As articulações, muitas vezes, estão sem flexibilidade e a coordenação já não é mais a mesma.
Temos brinquedos, móveis, acessórios e comida para crianças e animais. Porque não para os idosos? Como as crianças, idosos não têm força de preensão nem muscular. As articulações, muitas vezes, estão sem flexibilidade e a coordenação já não é mais a mesma.
A vida impõe isso! Não é uma “condição especial” ou “necessidade especial”. Todos passarão por isso! É a necessidade desta fase da vida.
Enfrentamos também problemas com o aparelho de DVD, tantas funções para quem quer apenas assistir um filminho!
O controle acima é para aparelhos de DVD e foi planejado para crianças, podendo também ser utilizado por idosos. Há uma versão para controle remoto de TV menos infantil (Weemote Sr). As teclas numéricas servem para armazenar os canais preferenciais (http://usabilidoido.com.br). Pena que na época não não encontrei um desses, parecem muito bons. E as cores contrastantes facilitam encontrá-lo.
Na época meu filho desenhou um controle remoto mais ergonômico e funcional para minha avó, mas descobrimos que fazer um e adaptar a nossa TV seria inviável. Mandamos o desenho para algumas empresas e não obtivemos resposta. O ideal seria que ao comprar uma TV, ela viesse com dois controles, pois como saber se quem está adquirindo é um idoso ou tornando-se um? Ou como eu, sem poder usar as mãos e usando o dedão do pé?
(Imagem)
Hoje, são 7,7 milhões os brasileiros com 70 anos ou mais. Em 2050, serão 34,3 milhões. O Brasil já ocupa o oitavo lugar no mundo com mais idosos. O rápido processo de envelhecimento da população, devido à associação de maior expectativa de vida e queda na taxa de natalidade, está mudando a cara do Brasil, que, em poucas décadas, deixará de ser um país de jovens para se tornar um país de idosos. Os dados estão na Síntese de indicadores sociais, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2004.
É um descaso! Mentes tão ricas, experiências fartas e tanta sabedoria num mundo feito para outros, num mundo que os tornam DEFICIENTES e INCAPAZES.
Meus avós queridos
Mariza Helena Machado
Tens razão infinita em tudo o que tange ao controle remoto. Estamos com o mesmo problema e o "deus" google não tem a resposta. Não atentaram (a industria) quão bons consumidores são os idosos. Principalmente fiéis.
ResponderExcluirQue tal uma parceria para produzir um?
ResponderExcluirHoje muita gente compra eletroeletrônicos pelo controle remoto. Até eu!
Vamos esperar. A dica foi dada.
Abraços
Estou com o mesmo problema. Meu pai tem 90 anos e não mora comigo. Em varias ocasiões em que o visito constato algum problema com sua única diversão: a TV! E na maioria das vezes isso ocorreu por ele ter apertado algum botão indevidamente. Pesquisei na internet e o único controle razoável que encontrei foi um fabricado pela Sony modelo RM EZ4, que encomendei pelo ebay.
ResponderExcluirCreio que não somente os idosos sofrem com essa insensibilidade da industria. Conheço muitas pessoas não idosas que não sabem manipular um controle remoto de TV.
Jayme kobayashi
Oi Jayme, obrigada pela visita!
ExcluirHá pouco investimento e preocupação pela inclusão no Brasil. E aqui não entram só os idosos, há os deficientes físicos, as crianças, os deficientes intelectuais, os analfabetos ... que quem sabe estão em casa agora com a tecla mute ligada ou levando um susto porque a tecla sleep desligou a TV. E não temos só TV, há os microondas com infinitas teclas, a máquina de lavar e até os celulares, com letras e números minúsculos com teclas juntas: http://estardeficiente.blogspot.com.br/2010/09/celular-do-vovo.html
Em 1960, 3,3 milhões de brasileiros tinham 60 anos ou mais e representavam 4,7% da população. Em 2000, 14,5 milhões, ou 8,5% dos brasileiros, estavam nessa faixa etária. Na última década, o salto foi grande, e em 2010 a representação passou para 10,8% da população (20,5 milhões - dados do IBGE).Cabe a nós reclamar, solicitar, "encher o saco", afinal todos ficaremos velhos!
Abaços